O cérebro bilíngue – Conectar-se é o que importa!

Por Elaine Torresi

Falar mais de uma língua além de aumentar nossas oportunidades no mercado de trabalho, facilitar nosso acesso à informação e abrir nossos horizontes culturais e interpessoais, parece trazer também benefícios cognitivos. Mas o que é cognição? A cognição é um conjunto de processos mentais que envolvem a memória, a atenção, o pensamento, a linguagem, a imaginação, etc..

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Dentro dessa gama de aspectos, vários estudos vem destacando os efeitos do bilinguismo sobre a capacidade de controlar distrações durante a  execução de determinada tarefa, manejar diferentes atividades ao mesmo tempo e  adaptar-se mais rapidamente a novas situações, tendo apontado certa vantagem dos bilíngues em relação aos monolíngues. Além disso, pesquisadores observaram que esses efeitos formam uma espécie de “reserva cognitiva” em idosos bilíngues, que tem preservadas por mais tempo suas funções mentais, apresentando inclusive, um atraso de 4 a 5 anos no estabelecimento de demências e Alzheimer em relação aos monolíngues de mesma idade.

Mas o que acontece com o cérebro para que esses efeitos apareçam? Luk e colegas (2011)¹ foram os primeiros a relacionar esses achados comportamentais com o aumento do volume e integridade da matéria branca (constituinte das fibras que levam informações de uma região à outra no cérebro). Outras pesquisas confirmaram esses achados e foram ainda mais fundo mostrando que a exposição à uma segunda língua, através de um curso intensivo por um período curto de tempo (4 meses) também provocava aumento na matéria branca; no entanto, esse aumento não era mantido 1 ano após a interrupção do curso.²

Até muito recentemente, a grande  maioria dos estudos que relacionam bilinguismo e matéria branca utilizavam indivíduos idosos que aprenderam a segunda língua (L2) antes dos 10 anos e que vinham praticando as duas línguas ao longo da vida; assim, não era possível saber se esse aumento de conectividade devia-se ao aprendizado ter acontecido na infância ou ao fato de simplesmente de estarem praticando duas línguas.

Image courtesy of digitalart at FreeDigitalPhotos.net

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Para responder a essa questão, pesquisadores³ do Reino Unido analisaram imagens feitas com um aparelho de ressonância magnética (MRI) em adultos que aprenderam a L2 tardiamente (depois dos 10 anos de idade) e que usavam ambas as línguas diariamente, ficando atentos para que elas não estivessem fazendo nenhum tipo de treinamento linguístico na época do teste. Eles descobriram que os bilíngues, mesmo tendo aprendido a L2 tardiamente, apresentavam maior densidade de matéria branca em áreas relacionadas à linguagem, ao controle cognitivo e à interligação entre os dois lados do cérebro.

Os cientistas mostraram assim que a preservação das fibras condutoras está fortemente relacionada ao uso constante das duas línguas e não necessariamente à época de aquisição da L2.

Esses resultados reforçam a ideia de que nunca é tarde para aprender uma segunda língua e continuar praticando-a de modo a colher os benefícios biológicos, cognitivos e sociais que essa experiência pode nos trazer. Por outro lado, impõem uma grande interrogação: “Será que o brasileiro que aprende uma segunda língua, e que a utiliza por toda a vida de forma esporádica se beneficia biológica e cognitivamente disso? Fiquemos atentos a novos estudos que possam nos responder essa questão.

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Para saber mais (artigos científicos em inglês):

  1. Luk G, Bialystok E, Craik FIM, Grady CL (2011) Lifelong bilingualism maintains white matter integrity in older adults. J Neurosci 31(46):16808–16813. 
  2. Hosoda C, Tanaka K, Nariai T, Honda M, Hanakawa T (2013) Dynamic neural network reorganization associated with second language vocabulary acquisition: A multi- modal imaging study. J Neurosci 33(34):13663–13672.
  3.  Pliatsikasa C, Moschopoulouc E, Saddyb J (2015) The effects of bilingualism on the white matter structure of the brain. PNAS 12(5):1334-1337.

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