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Uma nova possibilidade para o tratamento do abuso de drogas

Por: Amanda Siena

Nosso cérebro é uma máquina complexa, que se comunica entre si e com várias partes do nosso corpo para que tudo funcione bem. Parte dos responsáveis por essa comunicação são os chamados neurotransmissores. Levam informação de uma região à outra e podem ser dos mais diferentes tipos. Dentre eles está o glutamato, que sabemos estar relacionado com aprendizagem e memória. Entretanto, novos estudos mostram que ele também tem grande importância no distúrbio de abuso de drogas.

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Pesquisadores da Universidade da Pensilvânia e do “National Institute on Drug Abuse” em Baltimore realizaram experimentos onde um rato é colocado em um tipo de caixa, contendo uma alavanca, que ao ser pressionada libera para o animal alguma coisa agradável para o mesmo, nesse caso a cocaína. Quando administrado uma substância que aumentava a neurotransmissão do glutamato (apenas nos seus receptores do tipo mGluR5), observou que os ratos pressionavam mais vezes a barra que liberava cocaína. De forma contrária, quando uma substância responsável por bloquear parte daqueles mesmos receptores de glutamato no cérebro, diminuindo então a atividade desse neurotransmissor, os animais diminuem significativamente o número de vezes em que pressionam a barra. Ou seja, diminuem a busca pela droga.

Anteriormente, acreditava-se que apenas a dopamina, outro tipo de neurotransmissor, associado ao prazer, fosse responsável por esse distúrbio. Esses resultados mostraram uma especificidade em regiões cerebrais, aquelas onde esse tipo de receptor do Glutamato está presente, relacionados à busca por drogas no cérebro. A utilização de medicamentos responsáveis por bloquear os receptores mGluR5 podem, futuramente, serem utilizados para diminuir essa busca. Abrindo um novo caminho para o tratamento do abuso de drogas.

Por que o LSD causa alucinações?

Por Cristiane dos Santos Costa - Aluna de graduação do Bacharelado em Ciência e Tecnologia na UFABC

Todo mundo já ouviu falar do LSD. Quem já experimentou essa droga certamente possui relatos bem intrigantes sobre “viagens” que incluem visões bizarras e sensações únicas, como sinestesia (sentir o cheiro de sons, ou o gosto de cores, coisas desse tipo).  Há quem diga que a substância expande a consciência, aumenta a criatividade e leva a experiências surreais. Isso já deixa claro que o efeito do LSD ocorre no cérebro, mas por que e como ele causa alucinações?

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Afinal, o que é LSD e quais são seus efeitos?

Dietilamida do Ácido Lisérgico – LSD, também conhecido como ácido ou doce, é uma droga alucinógena sintetizada pela primeira vez em 1938, pelo químico suíço Albert Hofmann¹, a partir de um fungo do centeio chamado Claviceps purpurea². Foi desenvolvido originalmente como um estimulante respiratório e circulatório¹. Trata-se de um líquido transparente sem cheiro e sem sabor que pode ser absorvido pela pele e mucosas em apenas 30 minutos!¹,³ Costuma ser ingerido por meio de fitas de papel que contêm a droga e são colocadas debaixo da língua¹. Basta uma pequena dose de 25 microgramas da substância para experimentar seus efeitos durante um período de até 12 horas!³ Tais efeitos incluem1,3,4,6:

  • Pupilas dilatadas e aumento da temperatura corporal;
  • Taquicardia, aumento da pressão arterial e suor excessivo;
  • Alterações de pensamentos, emoções e percepções;
  • Alterações nos sentidos (como distorção visual do espaço);
  • Impressão de que o tempo passa mais lentamente;
  • Desconexão da consciência do “eu”;
  • Paranoia, confusão, medo sem motivo aparente;
  • Ansiedade e comportamento psicótico (em caso de doses altas).

Os primeiros itens da lista são efeitos físiológicos; já os intermediários costumam ocorrer durante a chamada “good trip” (viagem boa) e os últimos surgem durante uma “bad trip” (viagem ruim)¹. Tudo depende do ambiente onde a pessoa se encontra, de como está se sentindo no momento em que ingere a droga, e claro, da dose.

A ação do LSD no organismo está relacionada aos receptores de serotonina. Para entender como a mágica acontece, é necessário conhecer um pouco mais sobre o funcionamento do cérebro.

Neurônios, sinapses químicas, neurotransmissores e receptores

De maneira bem resumida, a coisa é mais ou menos assim: os neurônios são tipos de células que compõem o cérebro; as sinapses químicas são o principal meio de comunicação entre dois neurônios, sendo a fenda sináptica o pequeno espaço entre eles; neurotransmissores são substâncias químicas que um neurônio “envia” para o outro e receptores são proteínas presentes na membrana do neurônio às quais os neurotransmissores se ligam5. Essa comunicação acontece em apenas um sentido, de modo que existe sempre um neurônio pré-sináptico (que libera os neurotransmissores) e um outro neurônio pós-sináptico (que interage com os neurotransmissores).5

Esquema ilustrando uma sinapse química
Esquema ilustrando uma sinapse química

Para entender melhor como isso tudo funciona, imagine que os neurônios são cidades, a fenda sináptica é o rio que separa essas cidades, os neurotransmissores são pessoas que viajam da cidade A (neurônio pré-sináptico) até a cidade B (neurônio pós-sináptico) e que os receptores são funcionários do correio da cidade B que recebem as mensagens da cidade A. Então as pessoas saem de A, atravessam o rio até B e, chegando lá, entregam suas respectivas mensagens aos funcionários do correio. Assim ocorre a comunicação entre as duas cidades.

Para saber mais sobre esse assunto, recomendo a leitura da postagem O que é o neurônio?, disponível aqui no Neuroblog.

Agora sim: o LSD no cérebro

imagem2Cada neurotransmissor possui receptores específicos.5 A serotonina é um neurotransmissor que faz, por exemplo, a gente se sentir feliz, e um dos seus principais receptores é chamado receptor 2A1,4. Foi dito anteriormente que as moléculas do LSD se ligam aos receptores da serotonina, mas por que isso torna essa substância tão potente em seres humanos, a ponto de pequenas doses ocasionarem efeitos intensos?

Bem, não se sabe ao certo qual é o mecanismo de ação do LSD no cérebro¹,4,6. Mas não pense que você leu esse texto até aqui em vão. Pesquisadores do Reino Unido utilizaram imagens de ressonância magnética funcional (fMRI) para estudar a ação de alucinógenos em usuários e descobriam que as regiões do cérebro que restringem a consciência são “desligadas”, permitindo que os pensamentos fluam livremente.¹

David E. Nichols, PhD, explica durante sua palestra4 “Neurociência do LSD” que, ao ligar-se à serotonina, o receptor 2A muda de forma devido a interações químicas entre a molécula de serotonina e a proteína que compõe o receptor. Por outro lado, quando a molécula de LSD se liga a esse mesmo receptor, ele também muda, mas passa a ter um formato diferente de quando se liga à serotonina. Nichols também diz que os receptores 2A estão presentes de maneira muito expressiva em todas as estruturas do cérebro envolvidas no processamento dos sentidos, percepção e consciência – por isso eles são tão importantes para os efeitos de drogas psicodélicas.

Portanto, é de se esperar que o LSD seja uma droga alucinógena, já que possui grande afinidade com receptores presentes em áreas responsáveis pela integração dos sentidos, de modo que a percepção de quem ingere a droga é profundamente alterada.

LSD faz mal?

Pode causar intoxicação se ingerida em grandes quantidades, porém acredita-se que não cause dependência4 e relatos de abstinência são muito incertos³, provavelmente por tratar-se de uma droga recreacional. É possível que o usuário de LSD torne seu uso frequente por sentir que a realidade não tem a mesma graça sem a alteração de percepção que a substância causa.

Em linhas gerais, o LSD é uma droga imprevisível, pois seus efeitos variam a cada dose ingerida.6 Como já mencionado anteriormente, o contexto em que se utiliza esse composto pode resultar em uma “bad trip” e revelar-se uma experiência traumatizante.6 Além disso, sendo o LSD  uma droga ilícita, não há como saber o grau de impureza do produto e seu consumo oferece riscos à saúde.

Qual será o gosto dessas cores?

Qual será o gosto dessas cores?

Existem pesquisas na área de medicina e farmacologia para aplicação do LSD como tratamento para algumas enfermidades como depressão e dores de cabeça crônicas. 6

Ainda há muito para se aprender sobre os mecanismos de ação do LSD no cérebro e muitos pesquisadores estão interessados em investigá-los. Trata-se de uma área de estudo muito interessante e com potencial para aplicações importantes. No entanto, ainda há bastante debate sobre a possibilidade de uso desta substância no Brasil, tanto pela ilegalidade quanto pelo preconceito e tabu que permeia o tema.

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Referências

¹ OLSON, Samantha. This Is Your Brain On Drugs: The Truth About Where LSD Trips Take Your Mind And Body. MEDICAL DAILY. Drugs. Junho 2014. Disponível em: <http://www.medicaldaily.com/your-brain-drugs-truth-about-where-lsd-trips-take-your-mind-and-body-287852> Acesso em: 27/03/2016.

² LSD. Wikipedia: a enciclopédia livre. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/LSD> Acesso em: 27/02/2016.

³ DIEHL, Alessandra; CORDEIRO, Daniel Cruz; LARANJEIRA, Ronaldo. Tratamentos farmacológicos para dependência química: Da evidência científica à prática clínica. Artmed, São Paulo 2010, pg 36-37.

4 INTERNATIONAL PSYCHEDELIC SCIENCE. II, 2013, Oakland, California. NICHOLS, D. E. LSD Neuroscience. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=LbUGRcuA16E>  Acesso em: 27/03/2016.

5 PURVES, Dale et al. Neurociências. 4ª ed, Artmed.

6 NATIONAL GEOGRAPHIC CHANNEL. Inside LSD. Explorer. Canadá. 45min23s. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=3aZre1Lib0o> Acesso em: 27/03/2016.

Neuroarte em destaque na Web Rádio UFABC

Na última edição do programa Café com Rosca da Web Rádio UFABC, o entrevistado foi o artista plástico e professor vinculado ao Bacharelado em Neurociência Francisco Carlos Nather.

Na entrevista, o professor Francisco comenta sua trajetória e experiência entre ciência e arte, as vantagens da interdisciplinaridade e a grande procura dos alunos pela disciplina de Neuroarte.

Quem perdeu o programa pode escutá-lo na integra aqui.

Agradecimentos:

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Pesquisador brasileiro fala de sua pesquisa em podcast

Nesta edição do Brain Science Podcast, o entrevistado é o pesquisador brasileiro Luiz Pessoa.  Para quem não conhece, o Brain Science Podcast é um podcast dedicado a assuntos ligados à neurociência.

A cada edição, a apresentadora Ginger Campell entrevista um pesquisador sobre sua área de interesse. São entrevistas relativamente longas que duram em torno de 40 a 50 minutos. Nesta edição o convidado é Luiz Pessoa, pesquisador que atualmente está na Universidade de Maryland. Ele é um dos principais pesquisadores que trabalha na relação entre emoção e cognição. É dele, inclusive, o artigo sobre o assunto na Scholarpedia.

Para quem gosta do assunto, vale a pena ouvir. Para ver uma lista de outros podcasts que tratam de neurociência, vale a pena ver este post aqui (meio antigo, mas a maioria dos sites ainda existem).

Divulgação Científica

Tradicionalmente, o jeito mais conhecido de divulgar resultados científicos é por meio de artigos publicados em revistas especializadas. Entretanto, nos últimos anos uma nova forma de divulgar ciência tem crescido: a divulgação por meio de blogs e sites.

Ao contrário do que ocorre em revistas especializadas, o objetivo destes sites é tentar explicar e discutir, de maneira mais simplificada a importância de diferentes descobertas científicas. Em um artigo publicado no Journal of Neuroscience, o pesquisador David Eagleman escreveu um manifesto defendendo a importância deste tipo de divulgação. Neste manifesto, ele lista seis motivos pelos quais ele julga ser importante cientistas participarem da divulgação. Não vou discutir aqui todos os itens, mas de maneira geral ele defende a importância de cientistas em ajudarem a contextualizar a importância e a limitação de diferentes descobertas.

Apesar deste trabalho ser recente, uma série de blogs já tem feito isso em Neurociências. Entre outros, vale a pena os blogs BrainBox, Neuroskeptic e o blog do Earl Miller, professor do MIT. No Brasil, também temos bons blogs de discussão científica, como o Coletivo AcidoCetico e o Prisma Científico.

Entretanto, em Neurociência, ainda são poucos blogs que fazem isso, com exceção do site da Profa. Suzana Herculano. Por isso, os professores e alunos da UFABC resolveram criar este blog justamente para isso. Aqui vamos discutir trabalhos relevantes em Neurociência de maneira critica sempre contextualizando a importância dos achados.