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É possível aprendermos qualquer língua estrangeira sem sotaque… Por quê?

Por Alexandre Olivieri – Aluno do Bacharelado em Ciência & Tecnologia – UFABC

Você acha que consegue ouvir todos os sons da fala de um chinês?

Assista os primeiros 55 segundos do vídeo a seguir:

E ai? Você conseguiu distinguir todos os sons? (zh, ch, sh, r)

Provavelmente a resposta é não!!!

Porém quando você era um bebê é certeza que ouviria!! Segundo estudos realizados pela equipe internacional de Patricia Kuhl da Universidade de Washington, crianças bem pequenas ainda não atingiram o que é a tendência natural de ficar “insensível” aos sons exclusivos de outra língua, que não a materna. Mas como nós aprendemos uma língua e o que isso tem de especial com o chinês? Hoje a teoria mais aceita para responder a essa questão é que já nascemos com essas ferramentas. Nosso cérebro desde criança é capaz de perceber os sons mínimos que mudam o significado das palavras, os fonemas, sem fazer distinção nenhuma a qual língua ele pertence, seja inglês, português ou chinês. No entanto, essa super audição dos bebês se perde progressivamente com o tempo, e segundo 1132978706-12132especialistas, o período em que isso se inicia é aproximadamente entre o sexto até o décimo segundo mês de vida, o mesmo em que a criança consegue memorizar mais e mais sons, após esse período a perda se acentua, sendo que aos sete anos de idade há uma intensificação ainda maior da perda da capacidade de aprender fonemas novos de outras línguas .

Isso quer dizer que ao nascer, a criança é capaz de perceber, aprender e reproduzir qualquer fonema, mas ao ser exposta a determinados conjuntos fonéticos, passará a reconhecer apenas os que lhe forem familiares e acabam perdendo também a capacidade articulatória de emitir esses determinados sons. Isso explica, por exemplo, porque, ao aprendermos uma língua estrangeira depois de adultos, é mais difícil produzirmos alguns sons que não pertencem ao sistema fonético de nossa língua materna.

E como os cientistas conseguiram saber dessa capacidade elástica do cérebro infantil é uma técnica a parte. A equipe treinou os bebês a escutarem o mesmo fonema repetidas vezes e, repentinamente, tocavam outro, muito diferente do sistema fonético habitual, ao mesmo tempo que mostravam para criança um brinquedo atraente. Com um pouco de prática, a criança passa a virar a cabeça para ver o brinquedo toda vez que ela perceber o som diferente, assim possibilitando contar e observar a reação do bebê.

file5981249389157Para o teste, os linguistas usaram dois fonemas extremamente parecidos, o som áfono alvéolo-palatal africado e o áfono alvéolo-palatal fricativo, no link você pode escutar ambos  (tente sentir a diferença entre os dois sem ver a tela, irá perceber como os bebês são bons nisso!)

O aspecto mais surpreendente desse estudo é por quanto tempo as crianças conseguiram guardar a diferença mínima entre os sons, algumas delas foram testadas até quinze dias depois de apenas cinco horas de brincadeiras com falantes nativos de mandarim. Além disso, num teste paralelo, a mesma equipe constatou que isso só acontecia caso as crianças aprendessem com uma pessoa. Quando escutavam as mesmas histórias infantis por um programa de TV ou apenas o áudio elas não viravam a cabeça quando escutavam o fonema diferente. Por causa desse estudo, hoje se pesquisam maneiras de tornar mais eficiente o ensino de línguas tanto para adultos quanto para os mais jovens.

A seguir você pode ver um TED Talk da Pesquisadora Patricia Kuhl sobre o tema:

https://www.ted.com/talks/patricia_kuhl_the_linguistic_genius_of_babies


Referência

Kuhl, P. K. et al. “Foreign-language experience in infancy: Efects of short-term exposure and social interaction on phonetic learning”, p. 9096-9101, PNAS v.100, 2003.